Temos recebido algumas perguntas referentes as recentes alterações das NR, se elas ainda estão vigentes e se a Ação Civil em andamento impediu novas modificações nas Normas Regulamentadoras.
No artigo de hoje, abordaremos esse tema com foco nas ações práticas, isto é, no dia a dia das empresas, de quem precisa estar por dentro dessas alterações.
Contextualizando as Normas Regulamentadoras
Publicadas em julho de 1978, as Normas Regulamentadoras (NRs) vem passando por contínuas mudanças, seja por alterações dos textos destas 28 normas, originalmente aprovadas pela Portaria 3.214/78, ou pela publicação de novas NRs.
Todas estas mudanças começaram a ser mais perceptíveis e significativas, a partir do ano de 2010, quando que, a quase totalidade dos grupos industriais e de empresários, agonizaram com o texto de uma nova NR 12 que trazia novos critérios de segurança para operação de máquinas e equipamentos.
A mudança desta NR causou enorme impacto, uma vez que demandava uma séria de adequações no maquinário de um parque industrial composto, em sua maioria por equipamentos antigos, e que estes não possuíam os itens de segurança exigidos pela nova NR 12.
NR 12: marco de um novo Contexto para a Legislação SST
A NR 12 foi um marco na história da legislação de SST por duas razões: primeiro pela enorme repercussão das exigências de seu texto publicado em 2010 e, posteriormente, pelo fato desta NR ter sido a “garota propaganda” do programa de modernização das Normas Regulamentadoras lançado pelo Governo Federal em 30/07/2019.
Se em 2010 as críticas centravam nas grandes adequações impostas pela NR 12 ao maquinário industrial, em 2019 foram substituídas por supostas flexibilizações das exigências previstas nas NRs e promessas do Governo de modernização, desregulamentação, simplificação e desburocratização das normas.
De julho de 2019 até março de 2020 várias outras normas, além da própria NR 12, foram alteradas seguindo os princípios da modernização e desburocratização, defendidos pelo Governo. Todavia, esse processo foi freado em março, não por consequências da pandemia, mas por uma batalha judicial entre Ministério Público do Trabalho (MTP) e o Governo Federal.
O principal ponto desta disputa consiste em possível descumprimento pela Secretaria do Trabalho de uma normativa elaborada e publicada em 2018 pela própria pasta, a Portaria MTB nº 1.224/18.
Em síntese esta Portaria estabelece procedimentos para a elaboração e revisão de normas regulamentadoras relacionadas à segurança e saúde no trabalho, principalmente no que se refere à consulta das alterações pelas organizações representativas do Governo, dos Trabalhadores e dos Empregadores, integrantes da Comissão Tripartite Paritária Permanente – CTPP.
Análise de Impacto Regulatório – AIR
Outro ponto questionado pelo MPT, consiste na ausência de uma Análise de Impacto Regulatório (AIR), prevista no artigo 5º da Lei nº 13.874/19, nos processos de revisões e edições das NRs.
De acordo com esta lei, propostas de edição e de alteração de atos normativos de interesse geral de agentes econômicos ou de usuários dos serviços prestados devem ser previamente analisadas, considerando os possíveis efeitos do ato normativo para verificar a razoabilidade do seu impacto econômico.
De forma resumida, com fundamento nestes dois pontos, o MPT propôs uma Ação Civil Pública contra a União que tinha 2 objetivos principais: suspender os efeitos da Portaria 1.359/19 (que altera o Anexo 3 da NR 09, em especial no que se refere ao adicional por exposição a calor) e que todas as edições/revisões das NRs cumpram com todos os trâmites legais.
Em tutela provisória (uma espécie de “liminar”) o MPT teve um de seus pedidos atendido: que a União cumpra, de forma integral, todos os requisitos previstos na Portaria 1.224/18 na edição, revogação, revisão ou alteração das NRs.
Recentemente inclusive, a União realizou, dentre outros, um requerimento no processo da Ação Civil Pública que foi acolhido: a postergação, durante a vigência da emergência de saúde pública, por até seis meses do prazo previsto para a inspeção de segurança periódica de vaso sob pressão, tubulação e tanque metálico de armazenamento, todos previstos na NR 13. Tal pedido de reconsideração foi aceito pelo juiz, e regulamentado pela Portaria ME nº 15.797/2020.
Afinal, as mudanças recentes das NRs foram ou não canceladas?
Entretanto, o que estamos vendo são diversas matérias divulgadas em meios de comunicação que levam ao entendimento de que as NRs modificadas pelo atual governo perderam validade ou foram canceladas, em uma conclusão divergente do que foi determinado na liminar (tutela antecipada) concedida na ação. Resumindo, não houve cancelamento, suspensão ou revogação de qualquer Norma Regulamentadora – NR, recentemente alterada, pelo menos até então.
Outro ponto que tem gerado questionamento é com relação às NRs que foram alteradas, mas que ainda não entraram em vigor. Como exemplo podemos citar as NRs 01, 07, 09 e 18, todas praticamente “republicadas” no ano de 2020, mas que entrarão em vigor apenas em 2021.
Sobre estas futuras alterações, todas também estão vigentes, pelo menos até que o mérito da Ação Civil Pública seja julgado, pois, como já mencionado, o que temos de concreto é uma liminar em favor do MPT determinando que novas alterações de NRs cumpram todo o rito legal.
Aproveitando, vamos esclarecer outra informação equivocada: as alterações das NRs não estão suspensas. Isso mesmo, o Governo pode realizar alterações ou edições nas NRs desde que sejam observadas todas as diretrizes da Portaria 1.224/18 e os procedimentos para Análise de Impacto Regulatório (AIR) previstos no artigo 5º da Lei nº 13.874/19.
Já que estamos falando da Lei 13.874, ainda durante o andamento da ação tivemos a publicação do Decreto 10.411/2020, que regulamentou um dos pontos questionados pelo MPT: ausência de uma Análise de Impacto Regulatório (AIR), prevista no artigo 5º da Lei nº 13.874/19. Isto é, embora já previsto em legislação, esta AIR não havia sido regulamentada, ou seja, não existia uma diretriz para direcionar sua execução. Esta inclusive foi, na época, uma das alegações da União em sua defesa.
Decreto 10.411/2020: novas diretrizes para as revisões das NRs
A publicação do Decreto 10.411/2020 acabou inclusive, alterando as discussões da última reunião da CTPP (Comissão Tripartite Paritária Permanente) o qual trataria a retomada do cronograma de revisão das NRs, reunião esta, realizada em 30 de junho e 01º de julho deste ano.
Embora a bancada do Governo garanta que todo processo de alterações das NRs tenha sido realizado em conformidade com os critérios de análise de impacto econômico, optou-se pela revisão dos processos para se verificar eventual necessidade de adaptação, considerando as exigências previstas no Decreto 10.411[1].
Diante de todas estas situações e contexto que vivemos, o que temos de concreto hoje é que, enquanto não existir uma decisão contrária na Ação Civil Pública movida pelo MPT:
- A Portaria 1.359/19 (que alterou a NR 09 quanto ao agente calor) está vigente;
- Todas as modificações, revisões e revogações recentes das NRs estão vigentes;
- Até então, as novas versões das NRs 01, 07, 09 e 18 publicadas em 2020 entrarão em vigor em 2021;
- O Governo não está impedido de publicar novas NRs ou alterar as já existentes.
Caberá ao Poder Judiciário decidir pela manutenção ou revisão das NRs já oficialmente publicadas, caso seja verificada ausência de algum pressuposto de legitimidade nos processos revisionais.
Para nós, resta aguardar e torcer para as modernizações e desburocratizações estejam proporcionalmente equilibradas com a preservação e prevenção da saúde e segurança dos trabalhadores.
E você, como percebe o impacto das NRs? Deixe seu comentário abaixo e vamos discutir a respeito.
Ricardo Cardoso – Consultor Jurídico
[1] Fonte: ANAMAT – Associação Nacional de Medicina do Trabalho, publicado em 10/07/2020. (https://www.anamt.org.br/portal/2020/07/10/revisao-das-normas-regulamentadoras-pode-desacelerar/).
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